sábado, 11 de maio de 2013

A política econômica de Aécio Neves








Acautelem-se os brasileiros do riso fácil, tipo garoto propaganda de pó fixador para dentaduras, do candidato do PSDB a presidente da república Aécio Neves. 

Não exatamente por aquilo que seus partidários já fizeram quando no comando do Estado, mas pelo que dizem e anunciam os economistas que elaboram o programa de governo do senador tucano.

Quanto a isso, ninguém foi até agora mais claro do que faria o mineiro, se empossado dirigente máximo do País, que o professor da PUC do Rio e ex-integrante da equipe de Fernando Henrique Cardoso, Edmar Bacha.

Antecipa-nos o professor que, uma vez presidente, o mineiro do Leblon acabaria com todas as tarifas e restrições extra-tarifárias que limitam, inclusive nas compras governamentais, o acesso de bens importados ao Brasil e deixaria o comércio internacional flutuar ao sabor da taxa de câmbio. Aquela relação entre o real e o dólar que mostra quão vantajoso é ou importar ou adquirir um produto produzido dentro das fronteiras nacionais.  

Com isso – julga o sábio liberal – a indústria se modernizaria e os preços internos cairiam por força da maior concorrência da produção interna com importados produzidos a custo mais baixo em economias de maior produtividade que a nossa.

Judicioso com relação às contas nacionais, prevê uma forte procura por moeda estrangeira para realizar a mare montante de importações, que poderia ser atenuada por intermédio do estabelecimento de bandas de flutuação do câmbio, devidamente administradas pelo governo com a compra e venda de divisas quando fosse necessário.

Também ladino, como só o tucanos sabem ser, pensa em negociar o leito virginal do mercado doméstico com a obtenção de reciprocidades para nossas exportações nos países interessados em aqui aportar suas mercadorias e serviços. Chama isso de terceiro pilar de seu plano de "modernização" da economia. O segundo seria a flutuação suja do câmbio (assistida pelo governo) e o primeiro a fixação de uma âncora para os gastos públicos a fim de tornar inviável qualquer política de estímulo ao produto nacional.

Faz bico de tico-tico, no entanto, nosso pensador quanto aos efeitos de seu engenhoso tripé sobre o emprego de brasileiros. Se dissesse espantaria os incautos eleitores do candidato tucano, que pela proposta voltariam à fila do desemprego para vender a força de trabalho ao preço que estivesse disposto a pagar o empresariado nacional a fim de reagir ao assédio da indústria estrangeira.

Sim, porque rezam os manuais de economia que o câmbio para dar impulso à produção doméstica tem que estar apoiado numa forte compressão dos salários, apenas possível na hipótese de aguda competição pelo emprego entre trabalhadores.

A fórmula sustentada pelo professor é a mais antipopular possível: escancara-se a economia aos importados de modo promover-se com isso o desemprego da força de trabalho ocupada na indústria. A desocupação forçaria, por sua vez, a queda dos salários e dos preços permitindo assim que se chegue ao almejado sonho de aumentar as exportações com um câmbio depreciado. Num movimento que faria do Brasil uma espécie de China às avessas, já que aquela aproveitou a mão de obra barata egressa do campo para fazer-se industrialmente competitiva enquanto nós empobreceríamos nossos trabalhadores para retomarmos um ímpeto industrial de que se diz desvanecido.

Como se percebe, uma proposta de viabilidade eleitoral duvidosa que só pode ser veiculada com omissões sobre suas implicações sociais. É preciso por isso mesmo que se avise o quanto antes à audiência que aplaudiu Aécio Neves na festa de primeiro de maio, promovida pelos sindicalistas da Força Sindical, que mais uma vez a mágica encenada pelos liberais no Brasil assenta-se no sacrifício dos trabalhadores e na ampliação das desigualdades de renda, ditas sempre ardilosamente de curta duração.

Para quem aprecia idéias repetidas ou mesmo deseja tirar a teima, como se diz no jargão futebolístico, reproduzimos abaixo o artigo de Edmar Bacha publicado originalmente no jornal Valor Econômico de 9/05/2013 sob o pomposo título de "economia 2.0"


Economia 2.0
por Edmar Bacha

A economia brasileira está enferma. É isso que nos dizem os pibinhos, a inflação alta e a desindustrialização. São sintomas da baixa produtividade do país que tem a ver, entre outros fatores, com o atraso tecnológico, a escala reduzida e a falta de especialização que caracterizam nossas empresas de um modo geral. É o resultado do isolamento econômico a que o país se impôs em relação ao comércio internacional, com exportações que representam apenas 1,4% do total mundial. Agora que um brasileiro vai dirigir a Organização Mundial do Comércio, é boa hora de reavaliar essa política de isolamento e promover a integração competitiva do país à economia internacional.

Minha sugestão para essa integração é um programa pré-anunciado, sustentado em três pilares: reforma fiscal, substituição de tarifas por câmbio e acordos comerciais, a serem implantados de forma integrada e progressiva ao longo de um número de anos.

O objetivo do primeiro pilar, a reforma fiscal, seria permitir uma redução substantiva da carga tributária sobre as empresas, sem que isso implique um aumento da já elevada dívida pública. É atrativa uma fórmula adotada por Israel em 2010: fixar um limite superior para o crescimento dos gastos públicos igual à metade do crescimento potencial do PIB, estimado como sendo aquele observado nos últimos dez anos. No caso brasileiro, isso quer dizer um crescimento dos gastos públicos em termos reais entre 1,5% e 2% ao ano. Para reduzir o espaço de manobra para contabilidades criativas que subestimem os aumentos dos gastos (por meio de orçamentos paralelos, por exemplo), essa meta seria suplementada por limites também para o crescimento da dívida pública bruta. O detalhamento desse pilar seria feito a partir de estudo sobre os diversos componentes do gasto público e sobre as reformas necessárias para manter sua expansão sob controle. O primeiro pilar contribuiria para diminuir o "custo Brasil", que é o principal problema com que se defrontam as empresas para enfrentar a concorrência internacional.

O segundo maior problema é o câmbio. Esse é o tema do segundo pilar da proposta, a saber, a substituição da proteção tarifária contra as importações por uma "proteção cambial". Brevemente, trata-se de anunciar uma redução substancial, a ser implantada de forma progressiva, das tarifas às importações, dos requisitos de conteúdo nacional, das preferências para compras governamentais, das amarras aduaneiras e portuárias e das especificações técnicas de produtos distintas daquelas adotadas internacionalmente. O anúncio dessas medidas antiprotecionistas presumivelmente será feito por um(a) presidente convicto(a) de sua necessidade e com apoio no Congresso para sua implantação, ou seja, será um anúncio crível. Nesse caso, sob um regime de câmbio flutuante esse anúncio terá o efeito de desvalorizar o câmbio, pois os agentes financeiros passarão a comprar dólares e a vender reais, para lucrar com o aumento da demanda de dólares que ocorrerá para efetuar as importações adicionais que serão facilitadas.

Esse é o pilar central do plano, pois, dando acesso a insumos modernos, ele possibilitará a integração da indústria brasileira ao comércio internacional, à semelhança do que hoje ocorre com a Embraer. Haverá ganhos tecnológicos, de escala e de especialização.

Todavia, é também o pilar mais controverso. Pois, de um lado, estão economistas, mais confiantes na racionalidade dos mercados e descrentes da eficácia de controles de capitais, para quem, desde que haja flutuação livre, o câmbio saberá encontrar seu nível de equilíbrio. Bastaria, portanto, reduzir a proteção tarifária que o câmbio se ajustaria automaticamente. De outro lado, estão economistas descrentes da racionalidade dos mercados financeiros e mais preocupados com os efeitos nocivos de uma flutuação excessiva do câmbio sobre as decisões empresariais quanto a investimentos de longo prazo. Esses economistas defenderiam a adoção de uma taxa de câmbio fixa mais desvalorizada, associada a controles severos sobre os movimentos de capitais.

Minha preferência é por um meio termo entre essas duas posições, envolvendo, em primeiro lugar, um estudo sobre qual seria a taxa de câmbio que equilibraria a balança comercial na ausência das medidas protecionistas que vão ser eliminadas. Essa seria a taxa de câmbio de referência para a definição de uma banda de variação cambial. Nos primeiros tempos, a banda seria mais estreita, mas ela seria progressivamente ampliada ao longo do tempo. Os limites dessa banda orientariam o Banco Central (BC) em suas intervenções no mercado, comprando ou vendendo reservas internacionais. Tais intervenções seriam acompanhadas por medidas macroprudenciais que parecerem pertinentes ao BC, para compensar os exageros, seja de otimismo ou pessimismo no mercado de câmbio. Dadas as incertezas envolvidas numa mudança estrutural da magnitude daquela aqui proposta, tanto a taxa de referência como a banda em torno dela seriam informação privilegiada do BC que delas daria notícia somente pelo padrão de intervenções no câmbio.

O terceiro pilar são os acordos comerciais internacionais. Dado o amplo mercado interno que abrirá às exportações dos demais países do mundo, o Brasil estará em condições de fazer negociações vantajosas para a abertura compensatória dos mercados de seus parceiros comerciais. O leque de possibilidades é amplo, envolvendo acordos multilaterais, regionais e bilaterais. O certo é que o país necessitará de liberdade de movimentos e, portanto, se não conseguir agregar a Argentina a esse projeto, seria o caso de transformar o Mercosul numa área de livre-comércio, preservados os entendimentos estratégicos em vigor na área da defesa. Outra questão a ser analisada é o sequenciamento entre a abertura unilateral e aquela negociada nos acordos. Na definição dessa sequência, não se poderá perder de vista que a troca das tarifas pelo câmbio é uma vantagem em si para o país. Os ganhos comerciais que vierem dos acordos serão adicionais àqueles propiciados por essa política de alocação mais eficiente dos recursos na economia brasileira.



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