terça-feira, 25 de agosto de 2015

Cunha chantageia Temer




Cena 1: passos apressados, Eduardo Cunha perseguido por jornalistas à porta da sala da presidência da Câmara onde se exilara por longas 8 horas no dia em que o Procurador Geral de Justiça denunciou-o ao Supremo por crime de corrupção e lavagem de dinheiro, deixa escapar por meio de declarações em "off" emitidas por acólitos incumbidos de defendê-lo à retaguarda, que, caso viesse a ser afastado em função dos crimes de que é acusado, arrastaria consigo personagens importantes da República;

Cena 2: rosto contristado, Michel Temer, vice-presidente da república, abandona sem dar também quaisquer explicações, em São Paulo, a sala onde se reunira pouco antes com Eduardo Cunha para tratar de assuntos relacionados à denúncia da PGR; Desta vez, é Cunha quem fala a imprensa, como quem dispusesse de certa autoridade moral sobre o interlocutor naquele momento: "o PMDB deve abandonar a articulação política do governo!".

Cena 3: surpreso, no café da manhã do dia seguinte, o mesmo Michel Temer estanca os olhos diante das manchete dos jornais, que apontam que o mesmo delator cujo depoimento fundamentara a denúncia contra Cunha disse que o intermediário da propina a Cunha, vulgo Fernando Baiano, representava também os interesses de ninguém menos que o próprio vice-presidente da República;

Cena 4: semblante austero, o vice-presidente da República procura a presidente eleita para dizer-lhe que via por finalizada a incumbência que lhe havia sido confiada na articulação política e que doravante se dedicaria ao que decidiu chamar assuntos de "macropolítica".

Vendo o filme inteiro parece não restar dúvidas de que Michel Temer foi finalmente garroteado por Cunha, como se diz lá na fronteira do Rio Grande do Sul. Depois de colocar-se como o unificador do país, segundo imagem que afastava-o mais de Cunha que de Dilma, já que a sobrevivência do primeiro depende única e exclusivamente da sua capacidade de tornar a crise de Dilma maior que a sua, Temer cedia e entregava os anéis para não perder os dedos.

E o que seriam os dedos para Temer? Ver-se arrastado para a mesma sina de Cunha que o ameaçou com um definitivo abraço de afogado. Os anéis para Temer seriam abdicar da coordenação política e quiçá, mais adiante, conduzir o afastamento do PMDB do governo.

Contudo, deixar de apoiar o governo não é bem o que Temer desejaria porque sabe o sagaz político que arrastar o PMDB não é tão fácil quanto se pensa. Estariam aí outros contendores seus dentro da sigla para abocanhar-lhe o quinhão que tem no governo, como já bem ensaiam o presidente do Congresso Renan Calheiros e o imbatível marechal de campo José Sarney.

Isto porque bem sabe o vice-presidente que parte expressiva dos deputados e senadores do partido não lhe seguiriam trocando a mais de 3 anos do fim de um governo o certo pelo incerto. Aliás um incerto tremendamente eivado de incertezas, desde que com a eventual queda de Dilma o poder não cairia por inércia nos colos do vice e tampouco do PMDB, que seriam tragados pela mesma lama em que se debate Cunha.

Que não haja dúvidas: Temer afasta-se da coordenação política e ensaiará subtrair a Dilma o apoio de seu partido porque está sendo chantageado por Cunha. Mas ao final, pela ausência de saídas seguras, a Temer restará o fado de voltar a ser um vice-presidente fraco e esvaziado e a Cunha...bom, esse então já terá passado.