sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O jogral dos juros altos







Quadro interessante começa a se desenhar entorno da discussão do que fazer com as taxas juros mantidas em níveis elevados pelo banco central a fim de prover estabilidade macroeconônica ao país, neste momento de agravamento da crise de solvência de importantes países da zona do euro, depois do rebaixamento da classificação dos títulos do tesouro norte-americano.






Como é sabido, as taxas de juros Selic, que funcionam como piso para as taxas praticadas no mercado financeiro brasileiro, foram fixadas em 12,5% na última reunião do comitê de política monetária do Banco Central como medida de política monetária destinada a fazer recuar a inflação que, pelas projeções da própria instituição, ameaçava romper o limite de 6,5% ao ano estabelecida para a meta de variação dos preços para o ano em curso.






Considerava-se líquido e certo, entre analistas de diferentes escritórios de consultoria, com privilegiado acesso aos meios de comunicação, que os juros continuariam a subir pelo menos mais 0,5 ponto neste ano, alcançando 13%, e chegariam a níveis ainda mais salgado em 2013.






Ocorre que estudos mais minuciosos sobre a estratégia de política econômica adotada pelo Banco Central para peservar o país dos efeitos da crise de 2008, demonstraram que as medidas de enfrentamento postas em prática foram por demais zelosas com a rentabilidade dos grandes bancos ( o que não surpreende dado o status de dandy de que desfrutava Meirelles junto aos conglomerados financeiros) indo muito além do plausível para garantir liquidez às operações do mercado interbancário (empréstimos entre bancos) e chegando mesmo a assegurar-lhes a rentabilidade via preservação do preço da mercadoria transicionada por essas instituições: o dinheiro.






Não carecia de tanto, diriam as sábias quituteiras da Bahia, desde que o sempre eficaz rebaixamento dos compulsórios (espécie de garantia sobre empréstimos que os brancos são obrigados a manter junto a autoridade monetária) e o franqueamento a linhas especiais de emergência bastariam para manter preservada a confiança dos depositantes no sistema financeiro nacional, de resto muito bem avaliado mundo afora.







Perdeu-se naquele momento oportunidade de ouro para alinhar as taxas de juros nacionais às internacionais, o que teria de quebra poupado a indústria nacional do infortúnio trazido pela intensa valorização do real verificada no momento seguinte, em decorrência da enxurrada de capitais forâneos atraídos ao país pelos ganhos de arbitragem proporcionado pelo diferencial de juro interno e externo, permitindo, com isso, que o desempenho da economia pudesse ser mais pautado pelo investimento produtivo, induzido por juros baixos, que por uma abundante oferta de crédito associada ao maior endividamento das famílias e empresas.






A recidiva da crise da crise financeira internacional a que hoje se assiste, reabre a perspectiva de decepar a meio corpo a píton dos preços que insinuava erguer a cabeça sob o impulso da valorização internacional das comodities agrominerais e da expansão da demanda via a maior participação dos salários na renda nacional e alternativas creditícias de menor risco.






Eis que as mesmas vozes que se levantavam há 2 anos atrás em favor do que chamavam de "medidas monetárias de cautela", retomam o conhecido jogral de projeções autoajustáveis que prevêm a manutenção dos juros para este ano em patamares irrevogavelmente elevados e quiçá ligeiro relaxamento da alta para o próximo. Uma concessão feita a sociedade quanto à possibilidade de existência de alguma luz no fim do túnel depois de purgada a luxúria do consumo. Um discurso ainda que destituído de bons fundamentos econômicos todavia de forte apelo numa cultura de base cristã dada ao sacrifício.






Mas tudo indica que desta vez o cansativo e pouco desinteressado número contará com pouca audiência. Tanto a presidente guerrilheira como seu banqueiro central, ele mesmo voto vencido em 2009 quando a diretoria que integrava no Bacen optou pela decisão que bonificou a intermediação financeira em detrimento da economia real (mundo da produção), enxergam na situação presente uma oportunidade rara de matar alguns coelhos com uma única cajadada. Um consenso mais informado sobre estratégias alternativas de combate a inflação, na nova situação de contas externas com reservas de US 350 bi, começa a se formar nos setores econômicos do país ligados a produção (comércio, indústria e serviços).






Já pensou na possibilidade de um Brasil com juros civilizados e sem o fantasma da inflação? Pois bem, esse momento parece ter chegado. O artigo abaixo de Claúdia Safatle, publicado no jornal Valor Econômico de 12/08/2011 auxilia a compreensão desse momento.












Claudia Safatle
12/08/2011






Os sinais de desaceleração da economia começam a ficar evidentes. Os grandes bancos funcionam em bases sólidas. Não há notícias de que empresas brasileiras estejam altamente alavancadas em derivativos, como ocorreu no segundo semestre de 2008. E, além dessas diferenças entre as condições brasileiras para o enfrentamento da crise de 2008 e hoje, há informações até então desconhecidas sobre os efeitos de políticas anticíclicas no país, sejam fiscais ou monetárias. O quadro em 2011 é mais claro.







Em 2008, o que se sabia da experiência histórica do país era que, ao menor sinal de turbulências no mercado internacional, a resposta da política econômica no Brasil era sempre a mesma: aumentar a taxa de juros para atrair capitais e fechar as contas do balanço de pagamentos. E, quando possível, apertar as condições fiscais para garantir a solvência do governo. Era a reação clássica de um país acostumado com crises cambiais. O Brasil nunca havia feito política monetária contracíclica e as autoridades temiam seus efeitos, avaliam fontes que estavam no governo em 2008.







Por outro lado, descobriu-se no início das turbulências daquele ano que empresas brasileiras estavam com elevadíssima alavancagem em derivativos cambiais, expostas em cerca de US$ 40 bilhões, com contratos recheados de truques e gatilhos. Uma redução precipitada dos juros e a desvalorização mais acentuada da moeda doméstica poderiam agravar a situação.
Tombini se posicionou a favor da redução dos juros em 2008.







Além do mais, a toda desvalorização do câmbio no país seguia-se a elevação da inflação. No segundo semestre de 2008, a economia ainda estava com crescimento acelerado e as expectativas de inflação esbarravam no teto da meta (6,5%).












Foi nesse ambiente que o Copom fez a reunião de outubro, após a quebra do Lehman Brothers em setembro, quando os créditos externos para o Brasil já haviam secado e a liquidez bancária estava empoçada, com grandes dificuldades para instituições de pequeno e médio porte. Em 29 de outubro, o comitê decidiu manter a Selic em 13,75% - após a alta de agosto.






Em dezembro, ao contrário do esperado, o Copom manteve os juros inalterados, sinalizando com redução só a partir de janeiro de 2009.







Esse foi um dos momentos em que o Copom recebeu mais críticas por parte de economistas e analistas de mercado. E, também, de políticos como o ex-governador José Serra, que considerou aquela foi uma oportunidade perdida para o país ousar em busca de taxas mais módicas de juros. O BC poderia ter reduzido a Selic em quatro pontos percentuais durante o ciclo recessivo que se iniciou então, argumentava o governador de São Paulo.







Revisitando a história recente, é possível descobrir alguns fatos não divulgados à época. Poucos dias após a quebra do Lehman Brothers, em 15 de setembro, os diretores do BC tiveram uma conversa em São Paulo. Alexandre Tombini, então diretor de Normas, foi o único a opinar a favor da redução dos juros naquele momento. O que foi ouvido com certa perplexidade pelos demais presentes.







Na reunião de dezembro, Tombini foi mais incisivo e posicionou-se totalmente a favor da redução da Selic. Outros diretores foram contra e ele chegou a dizer que não estava convencido dos argumentos contrários, mas votou com os demais pelo adiamento da decisão para janeiro. Naquela reunião, o Copom foi unânime, mas a ata trouxe um malabarismo verbal que deu o que falar.






Ela dizia que as restrições financeiras em curso poderiam esfriar a demanda e, portanto, conter a inflação. Nessas circunstâncias, a maioria dos membros do Copom discutiu a redução de 0,25 ponto percentual da Selic. Mas prevaleceu o entendimento pela manutenção da taxa inalterada até o mês seguinte, janeiro, quando o corte foi de um ponto. A direção do BC em 2008 se preocupou mais em fornecer liquidez para o sistema bancário e suprir o crédito em moeda estrangeira, que havia desaparecido, centrando todas suas atenções para evitar uma crise financeira no país.







À parte os engenheiros de obra feita, o fato é que ficou marcado na história da política monetária que o BC perdeu ocasião de ouro para reduzir os juros, como, aliás, fizeram os demais países. A experiência daquele período passou a pautar as análises do atual governo. Tudo o que não se quer nessa crise, dizem fontes oficiais, é repetir o "erro" de 2008. Ao contrário, a avaliação que se faz no governo - em meio às preocupações quanto às dívidas soberanas dos países da zona do euro e o temor de uma recessão global - é que há boas possibilidades para o Brasil aproveitar a maré e, finalmente, reduzir os juros.







A favor dessa ideia há vários argumentos. Diferentemente de 2008, o agravamento da turbulência externa coincide com a desaceleração da economia brasileira. Ontem saíram dados do IBGE sobre o varejo, que mostram desaquecimento moderado. As vendas cresceram 0,2% em junho sobre maio.






As empresas que não quebraram aprenderam com o susto dos derivativos e hoje estão mais comportadas. Os efeitos de uma desvalorização do câmbio sobre a inflação podem ser neutralizados pela queda nos preços das commodities que o Brasil exporta, atenuando, assim, as pressões sobre preços domésticos. Em 2008, isso não era claro, explicam fontes da época.






Há, portanto, melhores condições, estruturais e conjunturais, para se administrar uma política monetária contracíclica e forma-se um consenso, no mercado e no governo, de que a crise na Europa, EUA e Japão pode ajudar o país a começar a remover sua maior aberração: a de campeão de juros.































































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