sábado, 5 de outubro de 2013

Quem perde quem ganha





A decisão de Marina Silva de filiar-se ao PSB e figurar como vice na chapa desse partido à presidência da Republica atinge em cheio as pretensões eleitorais dos tucanos de chegarem ao segundo turno das eleições de 2014.

A decisão da ex-ministra de Lula de aliar-se a outro ex-ministro de Lula, Eduardo Campos, marca o fim de uma era em que a opção liberal para a sociedade brasileira ainda era vista como alternativa ao trabalhismo de esquerda do partido dos trabalhadores.

Não irá ao segundo turno o candidato Aécio Neves por haver ensejado com o discurso totalizante de “ser contra tudo que esta ai" a rejeição definitiva ao modelo tucano de economia e sociedade, orientado pela lógica do capital financeiro e submetido as forças tendenciosamente cegas do mercado.

Ainda que haja um perdedor de fato com a decisão de Marina Silva, o partido dos tucanos, não consta que haja um ganhador certo. Nada sugere que ao colocar-se como força reparadora das incongruências reais e imaginarias do governo em exercício possam os que dele dissentiram convencer a parcela do eleitorado disposta a apoiar Dilma Russef nas próximas eleições de que colaboradores possam se sair melhor que seus chefes.

Isso porque não existem 3 modelos de sociedade forjados pelos mesmo processo histórico que teve sua ruptura com o fim do governo de João Goulart. Disso sabem o neto de Miguel Arraes que com Jango ombreou nas lutas que culminaram com o golpe militar de 1964 e a companheira de Chico Mendes. a quem o partido dos trabalhadores deveu parte da seu mito de origem.      

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Dilma faturou com o 7 de setembro





No periódico destinado aos “supporters” das candidaturas de oposição, o veículo do jornalismo canhoto dos grupos Folha e Globo, o Valor Econômico, entrevista 3 ou 4 especialistas em política para concluir que o anticlímax produzido pelas manifestações do 7 de setembro não apenas prenuncia um cenário favorável para  candidatura Dilma como também impulsiona a ascensão da presidente nas pesquisas de opinião. Veja os porquês.
Com medo de violência, classe média esvazia manifestações
Valor Econômico de 09/09/2013
O novo perfil de manifestações sociais, com menor volume de pessoas e maior frequência de ações violentas entre os que protestam e a polícia, tende a afastar a classe média desse tipo de ato. Foi o que ocorreu em 7 de setembro e o que pode vir a ser observado nos próximos eventos do gênero, na opinião de cientistas sociais ouvidos pelo Valor.
Para o sociólogo e cientista político da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Paulo Baía, a violência continuamente divulgada nos atos desestimula adesões. "Nos protestos de sábado, estavam presentes os grupos mais violentos, não somente entre os manifestantes, mas também entre as forças institucionais", disse. "Só quem vai aos protestos agora são aqueles que valorizam o confronto, a violência como forma de proteger sua representação", disse, acrescentando que a disposição, nos atos em junho, era diferente. "Eram pessoas movidas por um sentimento de mudar o país", avaliou.
Cláudio Couto, cientista político e professor do curso de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), acredita que a menor participação popular nos protestos era esperada. "Ninguém se mobiliza o ano inteiro, há um refluxo normal nesse tipo de manifestação", disse. A tendência, então, é que os mais radicais permaneçam. No Rio, tanto os manifestantes, mais agressivos, quanto a polícia, pouco preparada, afastaram os cidadãos comuns, que desejavam apenas expressar sua opinião. "A resposta das forças institucionais no Rio foi mais violenta", afirmou. "Há pouca habilidade da polícia local para lidar com esse tipo de ato".
Para Túlio Velho Barreto, cientista político da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), de Recife, o ideário anarquista do grupo Black Blocs, um dos organizadores das manifestações nas redes sociais, ganhou força em um país em que há uma crise de representação dos partidos. "A crise do paradigma de esquerda é mundial, mas no Brasil se agrava porque os partidos são frouxos e pouco programáticos", disse.
Citando o caso recente da absolvição do deputado Natan Donadon, Barreto disse que população brasileira sofre de um acúmulo de impunidade e cinismo na atividade política no Brasil. "Há uma descrença generalizada da atividade política dentro do partido. O que não é necessariamente bom. Até hoje, não se fez democracia sem partidos", afirmou.
No Recife, conta Barreto, os protestos contaram com a participação de pequenos grupos. Algumas pessoas reunidas na Praça do Derby, centro do Recife, entraram em confronto com a polícia. "Eles usaram máscaras, foram abordados por policiais e se recusaram a se identificar", afirmou. Um outro grupo tentou se articular pelas redes

sociais para sair sem roupa pelas ruas. "A Secretaria de Defesa social já tinha se manifestado dizendo que iria prender todo mundo que saísse nu. O movimento perdeu força".
Na opinião de Barreto, os impactos na popularidade do governo Dilma Rousseff devem ser limitados. "É diferente do que ocorreu após as manifestações de junho, quando houve um grande desgaste dos governantes", afirmou.
Já o cientista político e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcus Ianoni aponta para uma leve recuperação na imagem de Dilma e para a continuidade do desgaste político que ronda a figura do governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), como os principais sinais dos protestos durante o dia da Independência.
Para Ianoni, o menor volume de pessoas nos atos pode refletir o fato de que a população entende que o governo federal está buscando soluções. E isso, na prática, ajuda a melhorar a imagem da presidente.
"O governo tem conseguido dar respostas à essência das demandas de junho, relacionadas aos serviços públicos de transporte, educação, e saúde", disse. "As pesquisas mostram que Dilma reverteu parte da queda de popularidade observada em junho, durante o auge dos protestos, e o PIB [Produto Interno Bruto] do segundo trimestre, com alta de 1,5% [em relação ao primeiro trimestre], mostrou que nossa economia não está perfeita, mas não está tão trágica como a oposição gostaria", afirmou.
A lógica não é a mesma no caso do governador do Rio. "Cabral, diferentemente de Dilma, não conseguiu dar esse tipo de resposta", afirmou. O fato de o PT ter deixado um "vácuo" no cenário político fluminense, abrindo espaço para lideranças do PSOL e de outras bandeiras com diretrizes políticas mais agressivas, também contribuiu para impedir a recuperação da imagem de Cabral. Para o professor da UFF, os confrontos violentos nos protestos do Rio refletiram a insatisfação com as respostas do governo do Estado em relação às demandas dos protestos de junho, bem como uma repressão institucional mais violenta aos atos.

A ausência de uma "espinha dorsal" política na coordenação dos protestos foi um dos pontos mais evidentes em Brasília e no Rio, segundo Ianoni. Para ele, o perfil "desorganizado" dos atos ocorridos no sábado deve prosseguir nas próximas manifestações.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Dilma com a iniciativa






Dilma pediu decisão popular sobre a convocação de uma Constituinte exclusiva. A proposta lançada pela presidente é nitroglicerina pura para as acomodadas instituições do País. Para o Congresso acostumado a votar em conta-gotas leis e emendas constitucionais que consagram proposições de grupos minoritários da sociedade e para o Judiciário, satisfeito em extrair poder da interpretação de preceitos contraditórios de uma Constituição crescentemente maculada por interesses particularistas.

Como na propaganda de um veiculo utilitário lá pelos anos 1970 cujo mote para o encaminhamento de toda e qualquer tranqueira era “bota na Kombi”, assim a carta Magna brasileira tem sido o destino final de todo o interesse que se pretenda intocável.

Convocado pela emissora de rádio da Rede Globo, a CBN, a opinar sobre o chamamento da presidente, o ex-ministro do Supremo Federal Ayres Brito, taxou-a de aventureira pelo fato de colocar em risco a estabilidade jurídica advinda da Carta de 1988. Nas suas palavras “essas coisas a gente sabe como começa e nunca sabe como termina”.

Por seu turno, antecipando-se à presidência do Congresso, a oposição parlamentar ao governo, trombeteou alto e bom som que a proposta formulada pela chefe do executivo é despropositada por transferir ao Congresso a responsabilidade pela crise da instituições representativas inauguradas pelas manifestações de ruas, já que depende dele Congresso a autorização para a convocação de plebiscito sobre a decisão da abertura de processo constituinte.

Não tem legitimidade, no entanto, nem este nem aquele para censurar a proposta presidencial. Não a tem o Congresso porque representado por Renan Calheiros, notório representante das oligarquias nordestinas, homem-forte do governo Collor e aliado de primeira hora de José Sarney, a quem deve seu retorno à presidência do Congresso depois de haver renunciado ao mandato quase duas décadas atrás para evitar a cassação por ofensas éticas à Casa a que deveria servir.

Não tem legitimidade também o Supremo porque seu presidente é chefe de um poder corrupto e responsável direto pelo colapso da administração da justiça em nosso País, que sujeita o cidadão a uma espera de 2 anos para assistir ao início da arbitragem de direitos em tribunais de pequena causa, nos quais se discute uma disputa entre vizinhos. O mensalão? Cortina de fumaça para ocultar essa ultrajante impotência do judiciário brasileiro para proporcionar segurança jurídica ao homem comum e distribuir justiça.

Devido a essa perda súbita e irrevogável de legitimidade das instituições e dos partidos políticos é que Dilma acerta quando propõe zerar o jogo e devolver ao povo, por meio da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva, o poder de decidir sobre as questões elencadas como relevantes à cidadania.

O poder da mídia, as regras da política, o funcionamento das grandes cidades, os negócios religiosos, tudo, simplesmente tudo estará sob o escrutínio nessa nova Constituinte. E aos partidos não restará outra saída senão fazer aquilo que é o seu principal papel, a disputa ideológica em torno de propostas para a sociedade.


terça-feira, 18 de junho de 2013

Constituinte Exclusiva Já






Toda energia não canalizada tende dissipar-se. E a energia mobilizada pelas manifestações que eclodem pelo País já não podem ser direcionadas a uma ou outra demanda isolada. Passagem de ônibus? PEC 37? Corrupção? 

Não! Cada um tenta puxar a sardinha para o seu lado enquanto a população nas ruas não quer menos que a reforma cabal e completa das instituições.

Não uma reforma conduzida por esses congressistas que estão aí, também eles alvo da fúria popular. Mas por outros, eleitos com o propósito de redesenhar as instituições e imprimir novo sentido de finalidade ao ordenamento jurídico.

Basta de salvadores pré-fabricados como o raivoso presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, erigido pelas organizações Globo como exemplo a ser seguido segundo a receita do estude, preste concurso público para sentar-se a mesa com os poderosos, ainda que arrote e solte gases à mesa.

A saída é coletiva tal qual a história ao longo dos tempos tem ensinado, mesmo que a confiança popular não favoreça nem os partidos nem os sindicatos, eles mesmos forças instrumentais de uma ordem a que se deseja por fim.

Mas o ímpeto transformador das mobilizações engendradas pela história se deixado só às ruas levam a becos sem saída, o fogo das barricadas mantido a arder noite a dentro extingue-se por si mesmo. O que não é de modo algum bom para a nação, pois se a montanha parir um rato haverá no futuro a violência que nasce da decepção.

Foi a Constituição de 1988 que abriu essa caixa de pandora com o primado que estabeleceu da soberania popular e da justiça social. Seu cumprimento, a ferro e fogo por meio dos programas sociais de larga envergadura nos governos Lula e Dilma, estabeleceu uma nova consciência de direitos incompatível com o funcionamento de instituições que a ela sobreviveram ainda eivadas de interesses particularistas das oligarquias conservadoras.

Da concentração da mídia aos poderes de investigação pelas instituições de Estado, tudo deve ser repensado segundo a legitimidade de uma nova Constituinte que exprima o espírito dos tempos, afinado com a inclusão social e a democracia direta tornada possível com os mecanismos de internet.

Dizer não ao Congresso, dizer não às oligarquias estaduais e ao economicismo que não vê mais que números e cifras enquanto a população padece nas cidades, exige como resposta a criação de uma instância de decisão e de reformulação das instituições que esteja acima dos poderes constituídos dos quais refoge toda e qualquer confiança.

Que as ruas vocalizem o grito de uma Constituinte soberana e exclusiva já, para o bem do Brasil!  


sábado, 1 de junho de 2013

Blogueiros a beira de um ataque de nervos






Contribuiriam muito mais os chamados blogueiros de esquerda caso se empenhassem em análises pouco mais sofisticadas sobre o momento que vive o País e sobre a relação de forças estabelecida entre tendências políticas que se batem pela sua hegemonia político-eleitoral.

Caíram de pau – como se costuma dizer – na elevação de juros promovida pelo banco central, bradam contra o que chamam de fogo cerrado mantido pela mídia sobre a politica econômica e seus resultados, criticam o oportunismo esperado de aliados do governo no fechamento de alianças e nas atitudes em votações do Congresso.

Como parecem não dispor de tranquilidade para análises que integrem diferentes dimensões da realidade numa visão de sentido politico claro, que ofereça uma interpretação ajustada aos avanços obtidos nos últimos anos pelos agrupamentos antiliberais na politica, esbravejam e transformam em narrativa de suspense o que deveria ser esclarecedora literatura da realidade nacional.

A alta recente dos juros decretada pelo Banco Central não se constituiu traição do presidente da instituição Alexandre Tombini à política de retomada do crescimento econômico promovido pela presidente. Foi antes medida que teve em vista antecipar-se à futura alta dos juros nos Estado Unidos, cuja economia vem dando sucessivos sinais de restabelecimento, e que uma vez deflagrada produziria uma fuga de capitais do Brasil em direção à praça nova-iorquina. Isso numa conjuntura em que o mais baixo crescimento da China vem derrubando os preços da comódites internacionais e ampliando perigosamente os déficites nas contas de transações correntes brasileiras.

Se o Banco Central não apontar para um embicamento dos juros quando os norte-americanos o fazem e o saldo de nossas contas de comércio vai a pique, o resultado será uma crise cambial. E aí, queridos, parafraseando Cacá Diegues de “bye bye Brazil”, poderíamos dizer "bye bye Dilma 2014”.

Agora, se a mídia explora a seu modo as novas circunstâncias da economia brasileira deveríamos fazer o mesmo em favor de uma perspectiva menos desanimadora. Mostrar que o transatlântico brasileiro irá descrever sua curva para não bater nos icebergs que se deslocam do rompimento da plataforma de poder das relações entre China e Estados Unidos; que vamos sim crescer mais lentamente, mas sem perder os ganhos de renda transferidos aos mais pobres que suportam eleitoralmente a pretensões do governo de esquerda de continuar no poder a partir de 2014; que a crise de 2008 reconfigurou a economia mundial, mas que não tirou o País do jogo das economias emergentes que influenciarão o panorama internacional até a segunda metade deste milênio.

Os surtos raivosos não ajudam o eleitorado que confia em Dilma e no governo das esquerdas a entender o que está se passando e em função disso o porquê dos políticos que se somam à presidente agirem de maneira dúbia sempre que lhes é solicitada a interveniência. Tampouco ajuda a intemperança dos que se dizem impacientes com as concessões da presidente.

Seguiremos mais lentamente, mas seguiremos. Só não podemos perder o papel de força aglutinadora das tendências políticas de esquerda que nos deram as diversas vitórias eleitorais nos últimos 15 anos. Resiliência é a palavra do momento.


sábado, 11 de maio de 2013

A política econômica de Aécio Neves








Acautelem-se os brasileiros do riso fácil, tipo garoto propaganda de pó fixador para dentaduras, do candidato do PSDB a presidente da república Aécio Neves. 

Não exatamente por aquilo que seus partidários já fizeram quando no comando do Estado, mas pelo que dizem e anunciam os economistas que elaboram o programa de governo do senador tucano.

Quanto a isso, ninguém foi até agora mais claro do que faria o mineiro, se empossado dirigente máximo do País, que o professor da PUC do Rio e ex-integrante da equipe de Fernando Henrique Cardoso, Edmar Bacha.

Antecipa-nos o professor que, uma vez presidente, o mineiro do Leblon acabaria com todas as tarifas e restrições extra-tarifárias que limitam, inclusive nas compras governamentais, o acesso de bens importados ao Brasil e deixaria o comércio internacional flutuar ao sabor da taxa de câmbio. Aquela relação entre o real e o dólar que mostra quão vantajoso é ou importar ou adquirir um produto produzido dentro das fronteiras nacionais.  

Com isso – julga o sábio liberal – a indústria se modernizaria e os preços internos cairiam por força da maior concorrência da produção interna com importados produzidos a custo mais baixo em economias de maior produtividade que a nossa.

Judicioso com relação às contas nacionais, prevê uma forte procura por moeda estrangeira para realizar a mare montante de importações, que poderia ser atenuada por intermédio do estabelecimento de bandas de flutuação do câmbio, devidamente administradas pelo governo com a compra e venda de divisas quando fosse necessário.

Também ladino, como só o tucanos sabem ser, pensa em negociar o leito virginal do mercado doméstico com a obtenção de reciprocidades para nossas exportações nos países interessados em aqui aportar suas mercadorias e serviços. Chama isso de terceiro pilar de seu plano de "modernização" da economia. O segundo seria a flutuação suja do câmbio (assistida pelo governo) e o primeiro a fixação de uma âncora para os gastos públicos a fim de tornar inviável qualquer política de estímulo ao produto nacional.

Faz bico de tico-tico, no entanto, nosso pensador quanto aos efeitos de seu engenhoso tripé sobre o emprego de brasileiros. Se dissesse espantaria os incautos eleitores do candidato tucano, que pela proposta voltariam à fila do desemprego para vender a força de trabalho ao preço que estivesse disposto a pagar o empresariado nacional a fim de reagir ao assédio da indústria estrangeira.

Sim, porque rezam os manuais de economia que o câmbio para dar impulso à produção doméstica tem que estar apoiado numa forte compressão dos salários, apenas possível na hipótese de aguda competição pelo emprego entre trabalhadores.

A fórmula sustentada pelo professor é a mais antipopular possível: escancara-se a economia aos importados de modo promover-se com isso o desemprego da força de trabalho ocupada na indústria. A desocupação forçaria, por sua vez, a queda dos salários e dos preços permitindo assim que se chegue ao almejado sonho de aumentar as exportações com um câmbio depreciado. Num movimento que faria do Brasil uma espécie de China às avessas, já que aquela aproveitou a mão de obra barata egressa do campo para fazer-se industrialmente competitiva enquanto nós empobreceríamos nossos trabalhadores para retomarmos um ímpeto industrial de que se diz desvanecido.

Como se percebe, uma proposta de viabilidade eleitoral duvidosa que só pode ser veiculada com omissões sobre suas implicações sociais. É preciso por isso mesmo que se avise o quanto antes à audiência que aplaudiu Aécio Neves na festa de primeiro de maio, promovida pelos sindicalistas da Força Sindical, que mais uma vez a mágica encenada pelos liberais no Brasil assenta-se no sacrifício dos trabalhadores e na ampliação das desigualdades de renda, ditas sempre ardilosamente de curta duração.

Para quem aprecia idéias repetidas ou mesmo deseja tirar a teima, como se diz no jargão futebolístico, reproduzimos abaixo o artigo de Edmar Bacha publicado originalmente no jornal Valor Econômico de 9/05/2013 sob o pomposo título de "economia 2.0"


Economia 2.0
por Edmar Bacha

A economia brasileira está enferma. É isso que nos dizem os pibinhos, a inflação alta e a desindustrialização. São sintomas da baixa produtividade do país que tem a ver, entre outros fatores, com o atraso tecnológico, a escala reduzida e a falta de especialização que caracterizam nossas empresas de um modo geral. É o resultado do isolamento econômico a que o país se impôs em relação ao comércio internacional, com exportações que representam apenas 1,4% do total mundial. Agora que um brasileiro vai dirigir a Organização Mundial do Comércio, é boa hora de reavaliar essa política de isolamento e promover a integração competitiva do país à economia internacional.

Minha sugestão para essa integração é um programa pré-anunciado, sustentado em três pilares: reforma fiscal, substituição de tarifas por câmbio e acordos comerciais, a serem implantados de forma integrada e progressiva ao longo de um número de anos.

O objetivo do primeiro pilar, a reforma fiscal, seria permitir uma redução substantiva da carga tributária sobre as empresas, sem que isso implique um aumento da já elevada dívida pública. É atrativa uma fórmula adotada por Israel em 2010: fixar um limite superior para o crescimento dos gastos públicos igual à metade do crescimento potencial do PIB, estimado como sendo aquele observado nos últimos dez anos. No caso brasileiro, isso quer dizer um crescimento dos gastos públicos em termos reais entre 1,5% e 2% ao ano. Para reduzir o espaço de manobra para contabilidades criativas que subestimem os aumentos dos gastos (por meio de orçamentos paralelos, por exemplo), essa meta seria suplementada por limites também para o crescimento da dívida pública bruta. O detalhamento desse pilar seria feito a partir de estudo sobre os diversos componentes do gasto público e sobre as reformas necessárias para manter sua expansão sob controle. O primeiro pilar contribuiria para diminuir o "custo Brasil", que é o principal problema com que se defrontam as empresas para enfrentar a concorrência internacional.

O segundo maior problema é o câmbio. Esse é o tema do segundo pilar da proposta, a saber, a substituição da proteção tarifária contra as importações por uma "proteção cambial". Brevemente, trata-se de anunciar uma redução substancial, a ser implantada de forma progressiva, das tarifas às importações, dos requisitos de conteúdo nacional, das preferências para compras governamentais, das amarras aduaneiras e portuárias e das especificações técnicas de produtos distintas daquelas adotadas internacionalmente. O anúncio dessas medidas antiprotecionistas presumivelmente será feito por um(a) presidente convicto(a) de sua necessidade e com apoio no Congresso para sua implantação, ou seja, será um anúncio crível. Nesse caso, sob um regime de câmbio flutuante esse anúncio terá o efeito de desvalorizar o câmbio, pois os agentes financeiros passarão a comprar dólares e a vender reais, para lucrar com o aumento da demanda de dólares que ocorrerá para efetuar as importações adicionais que serão facilitadas.

Esse é o pilar central do plano, pois, dando acesso a insumos modernos, ele possibilitará a integração da indústria brasileira ao comércio internacional, à semelhança do que hoje ocorre com a Embraer. Haverá ganhos tecnológicos, de escala e de especialização.

Todavia, é também o pilar mais controverso. Pois, de um lado, estão economistas, mais confiantes na racionalidade dos mercados e descrentes da eficácia de controles de capitais, para quem, desde que haja flutuação livre, o câmbio saberá encontrar seu nível de equilíbrio. Bastaria, portanto, reduzir a proteção tarifária que o câmbio se ajustaria automaticamente. De outro lado, estão economistas descrentes da racionalidade dos mercados financeiros e mais preocupados com os efeitos nocivos de uma flutuação excessiva do câmbio sobre as decisões empresariais quanto a investimentos de longo prazo. Esses economistas defenderiam a adoção de uma taxa de câmbio fixa mais desvalorizada, associada a controles severos sobre os movimentos de capitais.

Minha preferência é por um meio termo entre essas duas posições, envolvendo, em primeiro lugar, um estudo sobre qual seria a taxa de câmbio que equilibraria a balança comercial na ausência das medidas protecionistas que vão ser eliminadas. Essa seria a taxa de câmbio de referência para a definição de uma banda de variação cambial. Nos primeiros tempos, a banda seria mais estreita, mas ela seria progressivamente ampliada ao longo do tempo. Os limites dessa banda orientariam o Banco Central (BC) em suas intervenções no mercado, comprando ou vendendo reservas internacionais. Tais intervenções seriam acompanhadas por medidas macroprudenciais que parecerem pertinentes ao BC, para compensar os exageros, seja de otimismo ou pessimismo no mercado de câmbio. Dadas as incertezas envolvidas numa mudança estrutural da magnitude daquela aqui proposta, tanto a taxa de referência como a banda em torno dela seriam informação privilegiada do BC que delas daria notícia somente pelo padrão de intervenções no câmbio.

O terceiro pilar são os acordos comerciais internacionais. Dado o amplo mercado interno que abrirá às exportações dos demais países do mundo, o Brasil estará em condições de fazer negociações vantajosas para a abertura compensatória dos mercados de seus parceiros comerciais. O leque de possibilidades é amplo, envolvendo acordos multilaterais, regionais e bilaterais. O certo é que o país necessitará de liberdade de movimentos e, portanto, se não conseguir agregar a Argentina a esse projeto, seria o caso de transformar o Mercosul numa área de livre-comércio, preservados os entendimentos estratégicos em vigor na área da defesa. Outra questão a ser analisada é o sequenciamento entre a abertura unilateral e aquela negociada nos acordos. Na definição dessa sequência, não se poderá perder de vista que a troca das tarifas pelo câmbio é uma vantagem em si para o país. Os ganhos comerciais que vierem dos acordos serão adicionais àqueles propiciados por essa política de alocação mais eficiente dos recursos na economia brasileira.



segunda-feira, 6 de maio de 2013

Uma voz contra Gilmar Mendes







Sob o véu da militância política dos meios de comunicação uma afronta ao regime democrático pareceu, por dias seguidos, ter mudado de endereço. Tomou-se por petardo letal contra o regime de equilíbrio de poderes a emenda à constituição que estabelecia critérios para o Judiciário declarar a inconstitucionalidade de alterações na carta maior do País ao mesmo tempo em que o Supremo Federal adotava, pelas mãos do ministro Gilmar Mendes, iniciativa sem precedentes na história da República de interditar o debate sobre tema legislativo.

Inverteram-se deliberadamente os papéis de agressor e agredido entre os poderes da república colocados em confronto. No caso em que a iniciativa partiu do Congresso, discutia-se um primeiro passo no debate sobre tema que está longe de ser consensual entre constitucionalistas do mundo inteiro sobre até que ponto dispõe o Supremo de autoridade para avaliar a constitucionalidade de matéria legislativa diferente de leis ordinárias, como as emendas constitucionais. No caso em que foi protagonista um ministro do Supremo, o que se fez foi coibir de imediato a atividade mais fundamental do legislativo, que é a de discutir leis.

Aos poucos o sentido de cada um dos fatos, aquele que tomou lugar na casa das leis e o que partiu do gabinete de um único ministro do Tribunal, foi devidamente interpretado à luz da doutrina do direito e das suas implicações jurídicas para o processo legislativo e a independência dos poderes.Ficou claro que o ministro exorbitou de seu papel e arrastou o colegiado que integra para uma preocupante afronta à estabilidade do regime democrático.

Dentre essas vozes esclarecedoras sobre qual dos poderes avilta e qual é aviltado, merece destaque a do professor de direito constitucional da Universidade de São Paulo Virgílio Afonso da Silva, publicado no jornal Valor Econômico de 06/05/2013, que reproduzimos a seguir.


A emenda e o Supremo
Por Virgílio Afonso da Silva, Prof. de Direito Constitucional da USP
(Publicado originalmente no Jornal Valor Econômico de 06/05/2013)
Na semana passada, todos os holofotes estavam apontados para a Câmara dos Deputados, que discutia uma proposta de emenda constitucional (PEC) que, segundo muitos, é flagrantemente inconstitucional, por ferir a separação de poderes. Contudo, a decisão mais inquietante, em vários sentidos, inclusive em relação à própria separação de poderes, estava sendo tomada no prédio ao lado, no Supremo Tribunal Federal (STF).
No dia seguinte, nas primeiras páginas dos jornais, o grande vilão, como sempre, foi o poder Legislativo. A PEC analisada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara é polêmica, com certeza. Sua constitucionalidade é questionável, não há dúvidas. Mas, do ponto de vista jurídico, da separação de poderes e do direito comparado, a decisão do STF, que bloqueou o debate no Senado sobre as novas regras de acesso dos partidos políticos à TV e ao fundo partidário, é muito mais chocante.
O ponto mais polêmico da PEC é a exigência de que uma decisão do STF que declare a inconstitucionalidade de uma emenda constitucional seja analisada pelo Congresso Nacional, o qual, se a ela se opuser, deverá enviar o caso a consulta popular.
É quase um consenso entre juristas que um tribunal constitucional ou uma suprema corte, como é o caso do STF, deve ter a última palavra na interpretação da constituição e na análise da compatibilidade das leis ordinárias com a constituição. Mas muito menos consensual é a extensão desse raciocínio para o caso das emendas constitucionais. Nos EUA, por exemplo, emendas à constituição não são controladas pelo Judiciário. A ideia é simples: se a própria constituição é alterada, não cabe à Suprema Corte analisar se o novo texto é compatível com o texto antigo. Isso quem decide é povo, por meio de seus representantes. Mesmo no caso do controle de leis ordinárias, há exemplos que relativizam o "quase consenso" mencionado acima, como é o caso do Canadá, cujo Parlamento não apenas pode anular uma decisão contrária da Suprema Corte, como também imunizar uma lei por determinado período de tempo contra novas decisões do Judiciário.
Não há dúvidas de que o caso brasileiro é diferente. A constituição brasileira possui normas que não podem ser alteradas nem mesmo por emendas constitucionais, as chamadas cláusulas pétreas. Mas não me parece que seja necessário entrar nesse complexo debate de direito constitucional, já que o intuito não é defender a decisão da CCJ, cuja conveniência e oportunidade são discutíveis.
Neste momento em que o Legislativo passa por uma séria crise de legitimidade, não parece ser a hora de tentar recuperá-la da forma como se tentou. Tampouco quero defender a constitucionalidade da PEC no seu todo. O que pretendi até aqui foi apenas apontar que, embora extremamente polêmica, a proposta é menos singular do que muitos pretenderam fazer crer.
Já a decisão do ministro Gilmar Mendes, tomada na mesma data e que mereceu muito menos atenção da imprensa, é algo que parece não ter paralelo na história do STF e na experiência internacional. Ao bloquear o debate sobre as novas regras partidárias, Gilmar Mendes simplesmente decidiu que o Senado não poderia deliberar sobre um projeto de lei porque ele, Gilmar Mendes, não concorda com o teor do projeto. Em termos muito simples, foi isso o que aconteceu. Embora em sua decisão ele procure mostrar que o STF tem o dever de zelar pelo "devido processo legislativo", sua decisão não tem nada a ver com essa questão. Os precedentes do STF e as obras de autores brasileiros e estrangeiros que o ministro cita não têm relação com o que ele de fato decidiu. Sua decisão foi, na verdade, sobre a questão de fundo, não sobre o procedimento. Gilmar Mendes não conseguiu apontar absolutamente nenhum problema procedimental, nenhum desrespeito ao processo legislativo por parte do Senado. O máximo que ele conseguiu foi afirmar que o processo teria sido muito rápido e aparentemente casuístico. Mas, desde que respeitadas as regras do processo legislativo, o quão rápido um projeto é analisado é uma questão política, não jurídica. Não cabe ao STF ditar o ritmo do processo legislativo.
Sua decisão apoia-se em uma única e singela ideia, que pode ser resumida pelo argumento "se o projeto for aprovado, ele será inconstitucional pelas razões a, b e c". Ora, não existe no Brasil, e em quase nenhum lugar do mundo, controle prévio de constitucionalidade feito pelo Judiciário. Mesmo nos lugares onde há esse controle prévio - como na França - ele jamais ocorre dessa forma. Na França, o Conselho Constitucional pode analisar a constitucionalidade de uma lei antes de ela entrar em vigor, mas nunca impedir o próprio debate. Uma decisão nesse sentido, de impedir o próprio debate, é simplesmente autoritária e sem paralelos na história do STF e de tribunais semelhantes em países democráticos.
Assim, ao contrário do que se noticiou na imprensa, a decisão do STF não é uma ingerência "em escala incomparavelmente menor" do que a decisão da CCJ. É justamente o oposto. Além das razões que já mencionei antes, a decisão do STF é mais alarmante também porque produz efeitos concretos e imediatos, ao contrário da decisão da CCJ, que é apenas um passo inicial de um longo processo de debates que pode, eventualmente, não terminar em nada. E também porque, se não for revista, abre caminho para que o STF possa bloquear qualquer debate no Legislativo sempre que não gostar do que está sendo discutido. E a comprovação de que essa não é uma mera suposição veio mais rápido do que se imaginava: dois dias depois, em outra decisão sem precedentes, o ministro Dias Toffoli exigiu da Câmara dos Deputados explicações acerca do que estava sendo discutido na CCJ, como se a Câmara devesse alguma satisfação nesse sentido. É no mínimo irônico que, na mesma semana em que acusa a Câmara de desrespeitar a separação de poderes, o STF tenha tomado duas decisões que afrontaram esse princípio de forma tão inequívoca. A declaração de Carlos Velloso, um ex-ministro do STF que prima pela cautela e cordialidade, não poderia ter sido mais ilustrativa da gravidade da decisão do ministro Gilmar Mendes: "No meu tempo de Supremo, eu nunca vi nada igual"!

quinta-feira, 2 de maio de 2013

ROTA QUE PASSA POR SÃO PAULO









Depois que a campanha presidencial foi deflagrada em abril último, as campanhas estaduais ganharam os diretórios partidários e os gabinetes palacianos dos governos estaduais. Não poderia ser diferente. Ao contrário da eleição passada, esta é uma eleição casada – para presidente e governador – e falar de uma sem mencionar a outra equivale à sugestão do pato manco.


Nas eleições estaduais do próximo ano joga-se também o desfecho das eleições presidenciais de 2018. Situação e oposição articulam suas candidaturas aos governos estaduais de olho na próxima grande disputa em que Dilma não poderá mais concorrer ao posto de chefe da nação em função do término de seu segundo mandado.

Depois da relutante aceitação do mineiro Aécio Neves como candidato nacional no ano que vem, o PSDB sinaliza lançar novamente Geraldo Alckmin em 2018, posicionando-o desde já como candidato à própria sucessão nas eleições estaduais que se aproximam.

Não foi por outro motivo senão o de tranquilizar Alckmin que Aécio Neves correu o risco de desgastar-se com a pecha de oportunista ao propôr, à revelia de caciques do partido, o fim da reeleição de presidentes no Brasil e a definição de um mandato de 5 anos para o governante que vier a suceder Dilma.

O PT, enquanto força hegemônica do situacionismo, também testa seus nomes para as eleições no Estado que deverá oferecer o mais competitivo candidato das oposições ao Planalto em 2018, São Paulo. Mas nenhum dos nomes postos até agora responde a contento aos desafios de uma eleição casada como a que se avizinha.

Os ministros da educação Mercadante, o da saúde Padilha e o da fazenda Mantega são nomes de prestígio mas que ainda precisariam demonstrar melhores resultados em suas respectivas áreas de atuação para credenciarem-se, com alguma chance de sucesso, à postulação de governador.

Nas eleições estaduais do ano que vem já não existe a possibilidade de neófitos surpreenderem e se imporem a nomes conhecidos – como foi o caso de Fernando Haddad na cidade de São Paulo – já que não mais haverá a mesma predominância de temas locais sobre os nacionais, que deu a vitória ao atual prefeito.

De outro modo, as próximas eleições regionais serão polarizadas em torno da figura do candidato presidencial com a atenção do eleitor fixada na manutenção de políticas que a seus olhos deram resultados. Por isso mesmo tendendo a favorecer nomes conhecidos, com calibre para postularem a presidência no pleito seguinte.

Esses atributos não parecem favorecer quaisquer das candidaturas postas pelo petismo. Exceto a da senadora Marta Suplicy, bem avaliada como prefeita e ministra da Educação, mas contra quem pesa um estigma difícil de ser removido, principalmente no interior do Estado, de haver criado taxas e – pasme – de haver se separado do “marido ideal”, o tonto Eduardo Suplicy. Nesse sentido Marta não seria páreo para Alckmin no mais conservador talvez Estado da Federação.

Para obter a vitória nas eleições paulistas do ano que vem há apenas um nome, gostem ou não da ideia as diversas frações que disputam o poder no interior do petismo. Esse nome é o de Lula da Silva, em desfavor de quem a mídia infla nomes de temporada, como fez agora com o de Marta Suplicy apontada pela Folha de São Paulo como o ex-prefeito prefeito mais bem avaliado da história recente da cidade de São Paulo. Sintomaticamente  depois de que o candidato Aloísio Mercadante, sentindo cheiro de fumaça, resolveu retirar a sua candidatura para dedicar-se aos projetos da pasta que dirige.

Lula talvez de momento não deseje a incumbência , mas o destino com que lhe acenam, de Jesus Cristo crucificado na cruz do mensalão e a defecção do governador Eduardo Campos, posta na praça por causa da suposta aposentadoria de Lula, seriam motivo o bastante para que o ex-presidente cogite dedicar os anos finais de sua vida ao papel de anjo da guarda do Brasil, numa rota que passa necessariamente por São Paulo.

domingo, 28 de abril de 2013

Folha: Jânio de Freitas acusa Gilmar Mendes







No picadeiro - JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SP - 28/04

O ato cogerador da 'crise' é de Gilmar Mendes, a pedido de um partido do próprio Congresso, o PSB


A "crise" entre o Supremo Tribunal Federal e o Congresso não está longe de um espetáculo de circo, daqueles movidos pelos tombos patéticos e tapas barulhentos encenados por Piolim e Carequinha. É nesse reino que está a "crise", na qual quase nada é verdadeiro, embora tudo produza um efeito enorme na grande arquibancada chamada país.

Não é verdade, como está propalado, que o Congresso, e nem mesmo uma qualquer de suas comissões, haja aprovado projeto que submete decisões do Supremo ao Legislativo. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara nem sequer discutiu o teor do projeto que propõe a apreciação de determinadas decisões do STF pelo Congresso. A CCJ apenas examinou, como é de sua função, a chamada admissibilidade do projeto, ou seja, se é admissível que seja discutido em comissões e eventualmente levado a plenário. A CCJ considerou que sim. E nenhum outro passo o projeto deu.

Daí a dizer dos parlamentares que "eles rasgaram a Constituição", como fez o ministro do STF Gilmar Mendes, vai uma distância só equiparável à sua afirmação de que o Brasil estava sob "estado policial", quando, no governo Lula, o mesmo ministro denunciou a existência de gravação do seu telefone, jamais exibida ou comprovada pelo próprio ou pela investigação policial.

De autoria do deputado do PT piauiense Nazareno Fonteles, o projeto, de fato polêmico, não propõe que as decisões do STF sejam submetidas ao Congresso, como está propalado. Isso só aconteceria, é o que propõe, se uma emenda constitucional aprovada no Congresso fosse declarada inconstitucional no STF. Se ao menos 60% dos parlamentares rejeitassem a opinião do STF, a discordância seria submetida à consulta popular. A deliberação do STF prevaleceria, mesmo sem consulta, caso o Congresso não a apreciasse em 90 dias.

Um complemento do projeto propõe que as "súmulas vinculantes" -decisões a serem repetidas por todos os juízes, sejam quais forem os fundamentos que tenham ocasionalmente para sentenciar de outro modo- só poderiam ser impostas com votos de nove dos onze ministros do STF (hoje basta a maioria simples). Em seguida a súmula, que equivale a lei embora não o seja, iria à apreciação do Congresso, para ajustar, ou não, sua natureza.

O projeto propalado como obstáculo à criação de novos partidos, aprovado na Câmara, não é obstáculo. Não impede a criação de partido algum. Propõe, isso sim, que a divisão do dinheiro do Fundo Partidário siga a proporção das bancadas constituídas pela vontade do eleitorado, e não pelas mudanças posteriores de parlamentares, dos partidos que os elegeram para os de novas e raramente legítimas conveniências. Assim também para a divisão do horário eleitoral pago com dinheiro público.

A pedido do PSB presidido pelo pré-candidato Eduardo Campos, Gilmar Mendes concedeu medida limitar que sustou a tramitação do projeto no Congresso, até que o plenário do STF dê a sua decisão a respeito. Se as Casas do Congresso votassem, em urgência urgentíssima, medida interrompendo o andamento de um processo no Supremo Tribunal federal, não seria interferência indevida? Violação do preceito constitucional de independência dos Poderes entre si? Transgressão ao Estado de Direito, ao regime democrático? E quando o Supremo faz a interferência, o que é?

Ao STF compete reconhecer ou negar, se solicitado, a adequação de aprovações do Congresso e de sanções da Presidência da República à Constituição. Outra coisa, seu oposto mesmo, é impedir a tramitação regimental e legal de um projeto no Legislativo, tal como seria fazê-lo na tramitação de um projeto entre partes do Executivo.

O ato intervencionista e cogerador da "crise", atribuído ao STF, é de Gilmar Mendes -e este é o lado lógico e nada surpreendente do ato. Mas o pedido, para intervenção contra competência legítima do Congresso, foi de um partido do próprio Congresso, o PSB, com a aliança do PSDB do pré-candidato Aécio Neves e, ainda, dos recém-amaziados PPS-PMN.

Com o Congresso e o STF, a Constituição está na lona.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Prefeito, não caia nessa!







Estará cometendo um grave erro o prefeito Haddad se cair no canto de sereia da adoção do rodízio de veículo o dia inteiro na cidade de São Paulo, nos termos do que propõe seu secretário do verde  Ricardo Teixeira. Erro técnico e político.

Do ponto de vista das suscetibilidades da classe média, seria intolerável que se colocasse restrições à circulação de transporte individual antes que tivesse melhorado em quantidade e qualidade o transporte coletivo na metropole. A política da denegação do prefeito anterior, de não pode isso não pode aquilo, deu no que deu: sua derrota no primeiro pleito a que se submeteu.

Fosse palatável ao eleitorado a proposta que o aliado de ocasião traz a baila, Haddad a teria sustentado ainda durante sua campanha eleitoral. Se não o fez, foi porque sabia de antemão desgastante e impopular a medida. De medidas necessárias, porém impopulares o inferno está cheio, haja vista a indefensável política de taxação da coleta de lixo que quase impediu a volta do PT ao poder municipal ao mesmo tempo em que baniu da administração pública a prefeita Marta Suplicy.

Se duvidar dos efeitos politicamente funestos da eventual instituição do rodízio de veículos, consulte o prefeito a biografia do ambientalista Fábio Feldman, que sem ousar tanto (o rodízio diário) teve a carreira política cessada depois que, quando secretário do meio ambiente do Estado, decidiu pela instituição do rodízio dentro do que se convencionou chamar de centro expandido da cidade.

Bonitinho em suas calças jeans, o neófito em administração pública Feldman viu minguar o eleitorado que lhe depositara confiança e nunca mais voltou à Câmara dos Deputados para onde havia sido eleito inicialmente com votação consagradora. O mesmo pode ser dito sobre a medida complementar ao rodízio, a inspeção veicular, também ela recusada pelo eleitorado na forma como vinha sendo implantada.

Mas é no campo da realidade concreta que o rodízio de veículos mostra-se uma medida ineficaz. Na cidade do México, onde foi implantada desde os anos 1980, a medida duplicou a frota circulante e elevou em 10 vezes a emissão de gases do efeito estufa. 

Desatendidas com transporte público de qualidade, as famílias preferiram adquirir um segundo ou terceiro veículo usado, os quais, em menos de uma década, tornaram a iniciativa absolutamente inócua e até mesmo impossível de ser revertida, já que cancelá-la implicaria em súbito e inexequível aumento do número de carros nas ruas.

Convém ao prefeito conservar seu capital de credibilidade deixando de recorrer a medidas momentosas que fujam ao dever de casa a que se propôs quando foi candidato, melhorar o transporte de massas com a construção de novos corredores de ônibus e a segregação do tráfego em favor do transporte coletivo.

O secretário do verde, que sugere a medida, não estará por perto quando o prefeito tiver de explicar ao eleitorado do porquê de haver baixado medida não combinada em campanha e sem que tivesse feito o que lhe cabia para mitigar as causas estruturais dos problemas de trânsito. 

domingo, 21 de abril de 2013

A Globo, o Carandiru e o Mensalão








Se faltavam provas para confirmar a instrumentalização que se faz das concessões de rádio e TV no Brasil para propósitos de interesse das empresas jornalísticas, essas nos são oferecidas agora com a cobertura absolutamente desproporcional com a dimensão dos fatos feita pelas maiores emissoras sobre o massacre perpetrado pela polícia miliar do Estado de São Paulo no extinto presídio do Carandiru há mais de 20 anos.

As transmissões do julgamento de parte reduzida da tropa que entrou atirando no pavilhão 9 do estabelecimento penitenciário naquele fatídico 2 de outubro de 1992 tiveram caráter laudatório, formal por assim dizer, sem os comentários de jornalistas destacados para fazer revelar os aspectos não aparentes dos procedimentos jurídicos em curso.

E o que foi o massacre do Carandiru? Nada menos que um evento macabro que manchou as instituições do País junto à comunidade internacional de direitos humanos ao longo dos 21 anos em que permaneceu aguardando julgamento. Duas centenas de presidiários foram sumariamente fuzilados depois de uma rebelião desfechada devido a briga de encarcerados.

Por coincidência, estive no Carandiru alguns dias antes do motim, e do massacre que lhe seguiu, a convite do então diretor Ismael Pedrosa. Ao lado do ex-deputado Álvaro Fraga, ouvi do diretor um relato desesperançado sobre a falta de recursos, a impossibilidade de separação de detentos e a confissão de que a qualquer momento “a panela de pressão iria arrebentar”.

Do lado de fora gritos e palavrões tornavam a deglutição difícil e a refeição, feita e servida pelos próprios presos, um repasto que demorava a terminar. Soube-se que fora ele, Pedrosa, quem acionara a PM para impedir o trágico acontecimento que informou temer naquele almoço.

Arrependeu-se do pedido de intervenção, disse-me Fraga depois, porque o que se viu foi uma das maiores tragédias do sistema prisional brasileiro. Mais que os 111 de mortos de que se tem notícia, porque, revelou Pedrosa, parte considerável das vítimas fatais havia sido transportada para fora do presídio por caminhões basculantes destinados ao transporte de lixo.

Pedrosa foi morto depois, quiçá por causa das informações que guardava, ainda antes que também o mandante Coronel Ubiratã fosse assassinado, ironicamente nu como aqueles a quem mandara matar.

Mas nem a morte de Pedrosa nem a morte do coronel foram associadas ao grande massacre de que foram protagonistas e testemunhas oculares, principalmente porque não interessou a imprensa, que se autoproclama independente, revelar as tramas que envolveram o episódio nesses 21 anos que se passaram.

Mas que diferença da postura adotada em relação àquele julgamento mais recente, denominado mensalão, em que estiveram envolvidos antagonistas da principal emissora de televisão do País, a Rede Globo.

Nesse, a cobertura foi acompanhada durante 4 meses com chamadas nos intervalos da programação, entrevistas exclusivas com especialistas e a designação de comentaristas especialmente destacados para formularem as interpretações jurídicas que a direção da emissora considerava devessem ser abraçadas pelos juízes do Supremo Tribunal Federal.

Não se interessou a Globo em tematizar o massacre do Carandiru em razão do fato de que fazê-lo seria expor os sucessivos governos paulistas que, apoiados pela emissora, buscaram resguardar seus oficias militares e retardar o julgamento sistematicamente cobrado pela comunidade internacional.

Tivesse-o feito estaria obrigada a esclarecer causas estruturais da violência noticiada diariamente em seus telejornais, como o surgimento da organização criminosa PCC – que se apresenta antes como organização de apoio social a encarcerados pós Carandiru – e a política prisional de depósito de gente seguida pelos governos estaduais, que deu ensejo à mais acelerada disseminação dos crimes violentos em São Paulo.


sexta-feira, 5 de abril de 2013

Dilma é o Lula de saias






O conservadorismo em politica não tem noção de seu próprio ridículo. Tomemos o exemplo dos elogios que deram de fazer alguns destacados tucanos a Lula ( sim, a ele Lula) por haver marcado seu governo com maior abertura ao que chamam de mercado e, permitido, desse modo, que as taxas de juros subissem ao sabor das conveniências do capital financeiro, muito bem representado na cúpula de seu governo pelo presidente do Banco Central Henrique Meirelles.


Como seria de esperar, a crítica não é movida pela honestidade. Elogiam Lula a fim de criar um divisor de águas que permita caracterizar Dilma não apenas como mais intervencionista do que o antecessor, mas principalmente como refratária aos interesses de banqueiros e de setores oligopolizados da economia.

É óbvia também a finalidade política da manobra. Incapazes de carregar o próprio candidato até os umbrais das eleições de 2014, em virtude da notória escassez de argumentos e carisma com que este se apresenta aos eleitores, os oponentes de Dilma preferem agir como no desenho animado em que o passarinho amarelo não hesitava em clamar proteção quando confrontado com gato da casa, gritando: é o gato! é o gato! Esperam com isso conquistar apoio nos setores empoderados da economia e mais farto financiamento de campanhas.

A comparação é, no entanto, improcedente. Dilma dá seguimento às políticas de Lula, apenas que confrontada com os novos desafios da economia em contexto de crise vê-se obrigada muito mais que ele a intervir com firmeza a fim de manter o ritmo da atividade e a inflação sob controle.

Quando Lula abandonou o governo, a grande crise iniciada em 2008 não havia revelado todos seus efeitos. A Europa ainda não tinha sido contaminada com a súbita desvalorização dos títulos da dívida de importantes países do continente e o excesso de liquidez a que o governo americano havia recorrido para debelar a retração da economia não havia batido à costa brasileira na forma de verdadeiro tsunami monetário, com efeitos deletérios na apreciação do real e, por isso mesmo, também nos resultados das nossas exportações.

À época o comprometimento de Meirelles com os interesses dos banqueiros, no sentido de manter elevadas as taxas de juros, fez com que o País perdesse a formidável oportunidade de equiparar as taxas praticadas internamente àquelas em vigor no resto do mundo. A circunstância transformou o Brasil no último peru de natal para especuladores internacionais, como gostava de dizer em tom crítico o ex-ministro Delfim Neto.

O discurso agora em voga, dando Dilma como intervencionista se comparada a Lula, vem reforçar  o caldo de cultura preparado junto a bancos internacionais por expoentes do governo Fernando Henrique Cardoso, de que Dilma pratica uma espécie de populismo econômico nocivo à sustentação do desenvolvimento do País. Imprecação que rendeu até artigo na revista The Economist no qual o periódico pede a demissão do ministro da fazenda brasileiro.

O populismo econômico é uma categoria criada pelos amigos do receituário monetarista de elevação das taxas de juros para designar todos os governos que insistem em garantir o nível de emprego, sem apelar ao aperto do crédito e à postergação de investimentos públicos, embalados na expectativa de que a confiança dos “mercados” venha substituí-los nessa tarefa quando um dia a crise internacional passar.

Ao contrário do que querem fazer crer as eminências tucanas, Dilma é uma recatada Lula de saias, que por isso mesmo não precisa dar bola a banqueiros em detrimento da lealdade devida à imensa maioria dos brasileiros. 

Daniela Mercury sapateou, e daí?







A cantora Daniela Mercury assumiu a homossexualidade e declarou que a editora do telejornal Bom Dia Brasil na Bahia, Malu Verçosa, é sua esposa. 

Deixou implícito, como justificativa do ato, o desejo de selar um protesto contra a permanência do pastor Marcos Feliciano a frente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.

Vinculou o deputado às suas declarações porque sabe que em sentido estrito não interessa a seus admiradores de que forma vivencia sua sexualidade, se com homens, se com mulheres ou qualquer outra espécie de ser vivente.

Trazendo o evangélico à cena, a cantora conferiu nobreza ao gesto e fez passar por manifestação de coragem o que não passou de tentativa de reavivar uma imagem artística abalada pela emersão de outros talentos no nicho musical que explora. Havia tentado fazê-lo antes, dando publicidade a sucessivas adoções de crianças e casamentos heterossexuais.

A manobra midiática funcionou. Festejaram seu destemor e contribuição à causa das minorias o porta-voz dos homossexuais, deputado Jean Willis e o jornal Folha de São Paulo, que conclamou outros a seguirem o exemplo da cantora e abandonar os armários em que ocultam a sexualidade. Como se todos fôssemos gays em potencial a espera da oportunidade que nos abre a ex-musa do axé.

Mas que se ponham as coisas em seu devido lugar. A saída de Feliciano do comando da Comissão de Direitos Humanos não é uma bandeira homossexual, é uma reivindicação dos negros, dos católicos, umbandistas e de todos os cidadãos portadores de direitos inalienáveis nos termos da Constituição.

A assunção da cantora brega não pode ser politizada porque a sociedade não se coloca contra a união de pessoas do mesmo sexo. As resistências que ainda existem devem ser vencidas, como estão sendo vencidas, pela radicalização da democracia e sua consequente institucionalização no âmbito dos costumes e da família.

Alguém dirá que a publicidade ganha pelo caso contribuirá, pela exemplaridade,  com os avanços para a conquista desses objetivos. Não pensam assim os que não se deixaram levar pelos exemplos de Amy Winehouse e do compositor Chorão, vitimados pelo consumo de drogas. O que os personagens de TV fazem, fazem-no em favor ou desfavor de si próprios e não como entes exemplares cujas atitudes devam ser imitadas.

A tentativa de transformar opções pessoais em exemplos a serem seguidos não é própria das sociedades democráticas, mas de culturas dominadas pelo personalismo e pela observância de padrões modelares de conduta, do tipo dos que vigeram no Reino Unido na virada do século passado e vigem ainda na Coréia do Norte da dinastia dos Kim Jung.

Sapateie pois com quem quiser a cantora Daniela Mercury, isso definitivamente não interessa aos brasileiros.

quinta-feira, 28 de março de 2013

DISCRETO SUICÍDIO







A estilista Clotilde Orozco foi encontrada estatelada defronte o prédio em que morava em Higienópolis. Frequentadora da mídia, a empresária vinha passando por dificuldades financeiras nos negócios da moda, ramo em que estava havia 30 anos.


Principalmente depois que a polícia desmantelou serviços de agenciamento de cidadãos bolivianos que viviam em regime semiescravo para fábricas da região da Barra Funda, em São Paulo, onde tinha 200 empregados.

O curioso no caso é que a imprensa tão pródiga em anunciar fatalidades com alarde, não caracterizou a morte da colunável como suicídio, nem na sua forma atenuada de “queda seguida de morte”. Para a Folha de São Paulo e outros, a modista foi simplesmente “encontrada morta” no condomínio de residência e transportada pelo serviço de emergência.

Há duas hipóteses para a hipocrisia dos veículos de comunicação no caso. O primeiro é que se sentiam culpados pelo suicídio da mulher, esquecida pelas seções especializadas em moda desde que uma nova geração projetou-se com a glamorização dos desfiles da São Paulo Fashion Week.

A outra mais prosaica é que editores e jornalistas sentem-se penalizados quando gente igual a eles, que frequenta as mesmas rodas sociais e cujos cachorrinhos urinam nos meus postes do bairro mais chique de São Paulo, vê-se envolvida em episódios tão pouco estéticos como são as mortes violentas.

Nessas situações sentem-se tocados por uma compaixão que pensam alcançar também os leitores, os quais, de outro modo, se surpreendem amiúde com a omissão de registros sobre corpos que encontram todos os dias nas ruas. Mortes que por não serem noticiadas também não merecem a mesma atenção da polícia, predestinadas, por isso, a engrossarem as estatísticas de casos sem solução. Quase 75% do total, diga-se de passagem.

Mas não é preciso muita investigação sobre essa nova vítima da notoriedade, controlada a bom preço pela mídia chorosa dos momentos de desespero quando se desligam os holofotes e recolhem-se os microfones. A solidão, o abandono e, certamente, uma boa dose de antidepressivos. 

sexta-feira, 22 de março de 2013

Quem tem medo de Eduardo Campos?






No ano de 1966, Elizabeth Taylor surpreendia as plateias do mundo encenando uma dona de casa enfastiada com a rotina do casamento e em guerra velada contra o marido, nas telas e na vida real, Richard Burton.


De tão convincentes na representação do jovem casal de professores universitários, entregue ao álcool e aos ataques verbais mútuos, a dupla ganhou no ano seguinte o prêmio da academia de cinema de melhor ator e melhor atriz. Na época revistas de celebridades noticiavam os mesmos conflitos na vida pessoal dos atores.


No roteiro que o célebre dramaturgo Edward Albee havia escrito originalmente para o teatro, a crueldade de um parceiro com o outro não se saciava com as ofensas mútuas e necessitava do envolvimento de terceiros para consumar-se. A fim de extravasá-la convidam um casal amigo para o juntar e entregam-se a uma espécie de jogo da verdade em que toda sorte de mentiras e falsidades vem à tona numa longa madrugada de embriaguez e agressões morais.

O filme talvez tenha sido a mais contundente denúncia pública da indigência dos que escondem, por detrás da imagem de pessoas da sociedade e do véu de instituições oficiais, a penúria do espírito e a hipocrisia.

“Quem tem medo de Virgínia Woolf” também poderia se chamar “quem tem medo da verdade”, porque sua trama cabe à perfeição para iluminar o traço mais íntimo de personagens do mundo da política e a verdadeira natureza das instituições sob as quais selam seus pactos de interesses.

Senão como interpretar as declarações do governador de Pernambuco Eduardo Campos, que à cata de apoios para sua pretensão de candidatar-se a presidente da República afirma “ter muitas coisas em comum com Serra”, exatamente aquele que em sua malograda campanha ao Planalto tentou destruir moralmente a chefe da coalização que ele Campos a longos 10 anos integra?

Embriagado da popularidade granjeada com os pesados investimentos que desde os governos de Lula da Silva foram carreados para o nordeste a fim de desconcentrar o desenvolvimento, Campos deu de insinuar que ele próprio pode fazer muito mais do que fez o ex-presidente e faz agora a sua sucessora.

Cerca-se dos mais duros adversários dos programas responsáveis pela eliminação de 70% da miséria em seu Estado, dando voz aos que acusam essas políticas que ajudou engendrar de corromperem a disposição de trabalho dos mais pobres, como não se fartaram de dizê-lo o deputado Roberto Freire e o senador Jarbas Vasconcellos, seus mais novos aliados.

A torpeza com que se move Eduardo Campos no ambiente político não passa despercebida aos espectadores do drama que se desenrola para conservar a hegemonia das tendências de orientação trabalhista a frente do País.  Ao afirmar identificação com figuras odiados pela maioria dos nordestinos e ligadas às políticas de desmonte do Estado, Campos afasta-se de sua gente e revela a si mesmo um ator em conflito com as próprias convicções. 

Haverá de causar pena, como os personagens de Liz e Burton, mas sem merecer qualquer Óscar fora de cena. 


quarta-feira, 20 de março de 2013

A QUEDA de JOAQUIM BARBOZA








Como se costuma dizer nas esquinas, a chapa está esquentando para o ministro do Supremo Federal Joaquim Barboza. Ao dar azo à velha rixa entre juízes e promotores com críticas ácidas e generalistas à magistratura e advocacia – duas das instituições mais tradicionais do Brasil – o magistrado está se enredando numa trama de atritos que poderá leva-lo ao afastamento do cargo de presidente do STF.


Não que deixe de ter razão nas acusações e epítetos que lança contra seus pares de toga e de carreira. Mas o açodamento com que o faz, sem a mediação necessária dos meios da política, poderá fazer com que se ponha num ponto sem volta do caminho de confronto em que se lançou contra a máquina judiciária do País.

O caso é antes típico de uma análise de divã. Em certos momentos e em certas épocas homens comuns, sem o saberem, veem-se no papel de autômatos dos sentimentos que perpassam sua gente e seu tempo.

Também os demiurgos da história do final da primeira metade do século passado expressaram o inconformismo dos seus exercendo sobre eles uma espécie de liderança catalizadora que os arrastou invariavelmente para situações de conflitos sociais ou de confrontos bélicos. Eram movidos pelo ódio pessoal aos que julgavam responsáveis pela subalternidade e as ofensas impostas aos grupos de que eram egressos.

Com Joaquim não se passou diferente. Negro e ofendido, como todos não oriundos da elite europeia, o magistrado, depois de percorrer a longa carreira de funcionário público do judiciário, chegou ao seu topo em decorrência da decisão pessoal de um presidente da República, que chamou para si a tarefa de diversificar a composição étnica da cúpula do judiciário brasileiro.

Com assento na Alta Corte, o nomeado sucumbiu aos holofotes da cobertura midiática de um caso de raro interesse aos opositores do presidente que o nomeara, em vista das eleições que se desenrolava. Foi o bastante para que, no passo seguinte, já recostado à cadeira de presidente do judiciário, Barboza sacasse da algibeira o ódio que trouxera acumulado, quiçá desde a infância, para vergastar os que – ao menos por dever de ofício - devia urbanidade.

Ao invés de travar sua guerra com as armas da política e da articulação com aqueles que numa perspectiva histórica colocam-se igualmente contra as práticas do nepotismo e dos valores da plutocracia, Barboza optou por uma guerrilha à espécie da que fez o personagem capitão Nascimento no consagrado filme Tropa de Elite.

Fiou-se para o confronto na popularidade granjeada pela Rede Globo e por influenciadores de brancos poderosos do tipo do jornalista Merval Pereira. Nada disso lhe irá bastar quando os poderosos baterem à porta dos meios de comunicação para cobrar o fim da irascibilidade do magistrado ou quando, antes disso, a imprensa cansar-se dos contragolpes desferidos a guisa de sentimento de perseguição.

Ambos os desdobramentos já se insinuaram com as críticas ácidas feitas pelo desembargador do STJ Tourinho Neto à atuação do ministro e à recomendação do jornal O Estado de São Paulo de que o mesmo renunciasse.

Sim, não há como escapar à conclusão de que Barboza, ainda que injuriado, é um arrivista como foram Hitler e Mussolini a seu tempo. Ou em sentido mais restrito um frustrado, como chegou a dizer-lhe seu colega Gilmar Mendes. E nenhum arrivista durou mais que o tempo necessário para que se manifestassem os funestos efeitos de suas próprias bravatas e destemperos.

terça-feira, 19 de março de 2013

O IBOPE DA CARA FEIA








A última pesquisa Ibope vinda a público mostra um fenômeno até mais interessante que a inaudita popularidade da presidente em terras antes dadas a prestigiar aqueles delas egressos, como o Nordeste de Lula e Eduardo Campos. Afinal foi lá que a governante revelou seus mais sólidos índices de crescimento.

O aspecto interessante a ser destacado é que Dilma cresceu a despeito da pancadaria a que foi diuturnamente submetida na mídia falada e escrita de mais ampla circulação. Constatá-lo é mais fácil do que identificar suas causas.

Dilma sobe, em que pesem as forças em contrário, em razão daquilo que por paradoxal foi apontado como uma de suas principais debilidade: a dureza do sorriso e as feições crispadas como as de um chefe mal humorado.

Pois Dilma com esse carisma às avessas passa ao eleitor médio, sobretudo ao mais pobre, a firmeza que julga indispensável a fim de que sejam asseguradas as conquistas realizadas no último decênio, as quais reputa fruto da disciplina e do esforço pessoal.

A veemência com que a presidente refuta os detratores de sua política soa mais consistente que as críticas que lhe são movidas e calam fundo num eleitorado que aspira à segurança como a principal premissa para a definição de seu voto.

A oposição parece não entender que o perfil de eleitorado que emergiu como hegemônico no Brasil, a partir do que se convencionou chamar de era Lula, é conservador.

Não no sentido que dá ao termo o conservadorismo na economia e na política, de identificação com teses pró-mercado e intransigência com escândalos políticos. Mas no sentido de recusa do jogo político miúdo que passa ao largo do que seria o interesse da maioria, como foi o caso da reação da oposição às medidas de redução da conta de energia e da tributação sobre a cesta básica.

Depois do arquétipo do pai bonachão, os brasileiros parecem ter abraçado definitivamente o da mãe protetora e austera. 

domingo, 17 de março de 2013

O PENSAMENTO INVERSO


 
 
Com a ascensão de Eduardo Campos na preferência dos articulistas de periódicos de grande circulação e comentaristas de TV, começa a cristalizar-se no eleitorado tucano a sensação de que se o governador de Pernambuco for ao segundo turno das eleições presidenciais de 2014 contra Dilma terá o apoio de Aécio Neves, candidato do PSDB, enquanto a recíproca não é verdadeira: se o mineiro Aécio for ao segundo turno não terá o apoio do pernambucano Campos.

A expectativa é letal para as pretensões do candidato tucano que deixa de representar para o segmento da sociedade que se opõe ao governo petista a possibilidade de vitória no segundo turno. Se não tivessem nada a perder com a opção presidencial, ele e o seu PSDB, vá lá! Mas têm, e muito. Com a decisão de concorrer ao governo federal, Aécio e seu partido deixam escapar das mãos uma permanência tranquila e certa no governo de Minas Gerais.  

Com o controle do governo de São Paulo sob crescente ameaça, seja pela possibilidade de lançamento da candidatura Lula pelo PT em 2014 seja pelo desgaste de quase 20 anos ininterruptos de poder, entregar de bandeja Minas soa inaceitável à meia dúzia de caciques que controla o partido tucano.

Não seria de surpreender, portanto, que, a continuar a perda de apoio midiático, Neves recue do projeto presidencial, dando mais uma vez espaço à recolocação do velho “step” careca José Serra no veículo tucano.

Sem chances de ir ao segundo turno, porém reconciliado com a própria ambição, Serra abriria mão de trocar o PSDB por outro partido, como deu de ameaçar, o que pouparia o ninho de uma maior fragilidade em eventual disputa com Lula da Silva em São Paulo.

Se assim vier acontecer, Serra não teria a boa vontade dos correligionários como teve da outra vez em que concorreu à presidência da República. Seria escolhido apenas para figurar como candidato fantoche de modo a ocultar a real preferência de correligionários por aquele tido como verdadeiramente capaz de derrotar o campo petista, Eduardo Campos.